O povo de morro acima, governo ladeira abaixo, é o que
presenciamos na atualidade brasileira!
Desde maio do ano passado, tenho externado minhas
observações criticas sobre o governo do PT, já que antes, por motivos até mesmo
afetivos, eu me limitava a considerá-las apenas em foros internos e de forma
bastante discreta.
No entanto em minha trajetória de militância, observei
constantemente um divisor de águas sempre que se tratou de postura e
posicionamento político. E este lenheiro é o povo. Entre os interesses, a
vontade e o clamor popular e qualquer outra pretensão ou situação, minha
trincheira foi e será, invariavelmente, o povo brasileiro.
Tentei por várias vezes, em diversos lugares e
com figuras públicas as mais variadas, busquei comentar e refletir sobre a
situação brasileira, a partir da experiência da base, ali onde o Brasil real
acontece, muito antes da explosão popular que teve seu epicentro em São Paulo , sendo
desdenhado e até mesmo retaliado ao tentar insistir no assunto.
Não me restou então, ante essa situação de
exclusivismo e absolutismo do comando central da nação brasileira, intolerante
e autoritária, explicitar como lutador histórico, de forma mais pública, toda a
minha insatisfação e indignação, face à calamitosa situação nacional e os
desatinos do partido hegemônico no poder, mantendo-me no alinhamento histórico
incondicional quando desafiado, em lugar de ceder por interesses pessoais
Abordo a seguir alguns dos principais motivos do desgaste e
da quebra de confiança nos representantes eleitos e nas instituições
brasileiras, especialmente no âmbito federal:
1. Descontrole da economia, permitindo a volta da inflação,
fantasma que assusta a população;
2. Esquecimento e abandono dos compromissos assumidos com os
Prefeitos durante a campanha de 2010. O Brasil está nos Municípios, onde tudo o
que está acontecendo poderia ter sido visto com antecipação e em grande parte
corrigido, se a amnésia e o autoritarismo não tivessem predominado sobre a
vontade de dialogar e resolver questões objetivas da realidade brasileira com a
participação das lideranças municipais e o povo;
3.Manipulação da informação, com maciça publicidade, na
tentativa de mostrar um Brasil não verdadeiro, em lugar de reconhecer a verdade
e admiti-la como veículo transformador;
4. Intolerância no tratamento das divergências,
insistindo no inútil casuísmo palaciano de quem não tem a humildade de admitir
quando erra, nem a grandeza de revelar isso em público;
5. Excesso de paciência e tolerância com a corrupção em suas
mais variadas formas de manifestação ante o olhar incrédulo da população. O
partido hegemônico do governo federal jamais se posicionou com clareza e
contundência sobre essa doença maldita que no Brasil pode ser sinônimo de
genocídio, já que sua prática atinge milhões de brasileiros, privados por ela
de uma condição digna de vida;
6. Máquina pública hipertrofiada com abusiva existência de
trinta e nove ministérios que compõem a ampla rede de apoio e negociação do
Governo Dilma e a mesa da barganha indecente que cada um desses “ministérios”
engendra e carrega consigo, gastando em seu conjunto cerca de 200 bilhões de
reais, somente para manutenção administrativa;
7. Imobilismo e inconsciência ante o mais grave problema da
população, a nível nacional, a saúde, com as tabelas do SUS totalmente
defasadas, enquanto a Senhora Presidenta, além de não cumprir o índice
constitucional determinado à União agrava ainda mais tal situação, ao retirar 5
bilhões de reais do orçamento da saúde e transferi-los para a construção ou
reforma de estádios para a Copa das Confederações e a Copa do Mundo, com a
onda de corrupção que essa decisão desencadeou;
8. Renúncia de receita para incentivar a compra
de automóveis de passeio, retirando o imposto sobre produtos industrializados
(IPI) do Fundo de Participação dos Municípios (FPM), prejudicando as
prefeituras, endividando a população e desorganizando as cidades ao dificultar
ainda mais a mobilidade urbana, com o enorme crescimento da frota de carros
novos e o aumento da poluição ambiental de todo tipo. Foram mais de 8 bilhões
neste ato desatinado, que poderiam ter sido usados para melhorar a mobilidade
dos cidadãos em diversos aspectos;
9. Tentativa abusiva de imiscuir e controlar politicamente o
Supremo Tribunal Federal – STF, o Ministério Público e os partidos políticos,
além do Congresso Nacional;
10. Desdém no reconhecimento, análise e aceitação verdadeira
das manifestações populares, tentando diminuir sua origem e menoscabar sua
força, primeiro dizendo que eram os ricos, depois a classe média e agora,
quando vêem que é o povo inteiro que está nas ruas (81% aprovam as
manifestações, segundo o Datafolha), já não sabem o que dizer e nem podem
continuar afirmando que o Brasil está saudável, limpinho, perfumado e feliz,
como vinha sendo propalado, chegando ao ponto de proferir ameaças, como fez o
Ministro da Justiça aos caminhoneiros, ao fecharem as estradas, protestando por
melhores condições de trabalho;
11. Insistência reiterada no intento de manipulação a crise,
atitude reveladora da absoluta incapacidade do partido hegemônico de lidar com
o povo, seja no governo, por se entrincheirar na mentira, ou na situação atual,
ao não querer admitir que a explosão popular não terminou e nem será
domesticada ou contida com mais um gesto de ameaça ou um ato pífio da
Presidenta, cujo único objetivo é tentar esvaziar a insurreição e trazê-la para
os gabinetes palacianos. Pobre engano! O movimento não parou e nem vai parar só
porque o governo federal quer e pensa que pode fazê-lo, desconhecendo a alma e
a energia do povo;
12. Desprezo ao conteúdo ideológico e político
das manifestações ao considerá-las apolíticas;
Em princípio, o aparente apoliticismo dos manifestantes, tem
sua raiz e explicação no desencanto com a situação a que chegamos e cujos
responsáveis são a maioria dos políticos de turno e não os de todas as épocas.
É, portanto, algo justo que reabre a esperança de mudança naquilo que o
oficialismo palaciano tem admitido, no máximo, ser “um movimento da classe
média”ou de “setores desorganizados”. Tal “raciocínio” está orientado por
marqueteiros que não conseguem enxergar as ansiedades, frustrações e sobretudo
a indignação da população brasileira, mas apenas os efeitos visuais de sua
mente defasada e distante da vida do povo.
Uma etapa da história brasileira encerrou: é
preciso criar o novo capítulo e este não será inventado na solidão da torre
palaciana, distante das ruas e praças do Brasil.
Tenho forte e profunda confiança que uma nova discussão
acontecerá, de forma rica e sustentável, nos espaços do povo, por todo o
Brasil, para surpresa e admiração dos céticos e analistas ultrapassados, a
seqüência das manifestações explosivas, que continuarão a eclodir, com os
protestos de diversas categorias sociais e suas peculiares características
psicossociais e políticas, desconhecidas da maioria dos aprendizes de
feiticeiras e seu receituário macabro.
As chamadas esquerdas, lugar de onde venho e não pretendo me
afastar, têm novamente, a condição e oportunidade de compreender isto, e assim,
respeitar e colaborar para geração de uma agenda capaz de tornar o Brasil mais
conhecido pelas virtudes e valores que defendemos, tão antigos como a
humanidade da qual somos parte vibrante.
O que está mais claro neste momento é que, quem
está nas ruas e não sabe ainda ou com clareza o que quer, sabe perfeitamente o
que não quer. E isto é suficiente para uma boa e sincera conversa.
Acabou a onda de mentiras, pois o povo está gritando e
continuará a fazê-lo, expressando com coragem e contundência: - o rei está nu
(o rei?) !
*José Prates é ex Prefeito de Salinas, por dois mandatos,
arquiteto e urbanista, escritor. Criado e líder dos movimentos Lulécio e
Dilmasia